O navio norte-americano "Okeanos Explorer" está na ilha do Faial e prepara-se
para seguir numa nova expedição, com uma investigadora portuguesa a bordo.
Um tracejado “desenhado” no fundo do oceano, nos Açores, está a correr as
redes sociais. A Administração norte-americana dos Oceanos e da Atmosfera
(NOAA, na sigla inglesa) partilhou no Twitter fotografias que foram captadas
durante a expedição "Voyage to the Ridge 2022" – viagem à cordilheira, em
português – e abriu portas à imaginação dos internautas.
“No mergulho do 'Okeanos [Explorer]' de sábado, vimos vários conjuntos
sublineares de buracos no fundo do mar. A origem dos buracos deixou os
cientistas perplexos. Os buracos parecem feitos pelo homem, mas as pequenas
pilhas de sedimentos ao redor sugerem que foram escavados por… alguma coisa.
Qual é a vossa hipótese?”, pode ler-se feita a publicação de 25 de julho.
On Saturday's #Okeanos dive, we saw several sublinear sets of holes in the seafloor. The origin of the holes has scientists stumped. The holes look human made, but the little piles of sediment around them suggest they were excavated by...something.
— NOAA Ocean Exploration (@oceanexplorer) July 25, 2022
What's YOUR hypothesis? pic.twitter.com/iGezxV9TK8
Estas marcas, identificadas a mais de 2.500 metros de profundidade, são
conhecidos como “Lebensspuren” – um termo alemão que significa “vestígios de
vida”. “São estruturas que encontramos nos sedimentos, normalmente a mais de
mil metros de profundidade”, explica à SIC Notícias Telmo Morato,
investigado do Instituto de Investigação em Ciências do Mar da Universidade
dos Açores - Okeanos. “São relativamente comuns nas planícies abissais e nas
zonas com fundo sedimentar (areias ou lamas)”, prossegue.
Há várias teorias sobre a origem e a funcionalidade destes buracos, mas, até
agora, não há certezas. Segundo uma das teorias, estes buracos são criados
por fósseis de seres vivos, ovos ou dejetos de animais marinhos. Há outra
onde se afirma que estes buracos são fontes de oxigénio.
“Pensam-se que são feitos por organismos marinhos, mas ainda ninguém na
realidade na comunidade científica internacional conseguiu perceber quem é
que faz essas estruturas no meio do mar e qual é a razão de isso existir”,
acrescenta o investigador.
Uma vez explicado, o mistério dos orifícios pode tornar-se menos
interessante do que a investigação ao fundo do oceano, que está a decorrer
no arquipélago e que conta com a participação de investigadores portugueses.
Uma missão que conta com investigadores portugueses
As fotografias partilhadas foram captadas durante a segunda parte da "Voyage
to the Ridge", que decorre ao largo do arquipélago dos Açores. O navio
norte-americano "Okeanos Explorer" está ancorado no Faial e prepara-se para
voltar ao mar este sábado com uma especialista portuguesa a bordo: Joana
Xavier, investigadora no Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e
Ambiental da Universidade do Porto.
No entanto, desde que começou a ser planeada, a missão conta com a
participação de um grupo do instituto de investigação Okeanos. Nos edifícios
da Universidade de Aveiro, no Faial, foi desenvolvido um centro de controlo
da expedição a partir do qual é feita a planificação da missão do navio
"Okeanos Explorer" e de todos os mergulhos realizados pelo veículo operado
remotamente (ROV, na sigla inglesa) que são realizados.
“A Okeanos da Universidade dos Açores tem vários papéis nesta missão do
[navio] 'Okeanos Explorer': um dos objetivos da nossa linha de investigação
é mapear as comunidades biológicas, as espécies, o capital natural da região
dos Açores com ênfase na Dorsal Meso Atlântica [a cordilheira que existe no
fundo do oceano Atlântico e que atravessa o arquipélago]. Como nos Açores
não existem navios de investigação de grande porte, não temos ROVs e o ROV
luso raramente está disponível para vir aos Açores, torna-se difícil pôr em
prática essa linha de investigação. A parceria com a NOAA e com o 'Okeanos
Explorer', não só é boa para a comunidade cientifica global, mas encaixa-se
na nossa linha de investigação”, explica Telmo Morato.
O projeto começou a ser pensado em 2017, mas só este ano se concretizou. Os
investigadores “enviaram várias notas de interesse ao 'Okeanos Explorer' e à
NOAA para que fosse feita uma campanha dedicada à Dorsal Meso Atlântica” e a
missão recebeu um parecer positivo por parte da instituição norte-americana,
tendo sido agendada para 2019. O shutdown ao orçamento norte-americano,
durante a Administração Trump, e a pandemia de covid-19 atrasaram o projeto
vários anos.
A missão, que é composta por três partes, que começou em março de 2022 e
estende-se até setembro. O objetivo é estudar o oceano profundo, em
particular a Dorsal Meso Atlântica, as suas cristas e montes submarinos e a
biodiversidade existente nesta região do oceano Atlântico.
Outras missões em simultâneo para conhecer o fundo do oceano
Além da parceria com a NOAA e a missão no navio "Okeanos Explorer", os
investigadores da Universidade dos Açores têm em curso também outras missões
de exploração da Dorsal Meso Atlântica.
Uma dessas missões resulta de uma pareceria com a Aliança Europeia de
Infraestruturas para Investigação Marinha - Eurofleets, através da qual foi
atribuído o navio holandês "Pelagia" a uma equipa liderada por
investigadores da Okeanos - Universidade dos Açores. As duas missões estão a
decorrer em simultâneo e complementam-se: “Estivemos em contacto permanente
com o "Okeanos Explorer" para coordenarmos os sítios em que íamos trabalhar
no "Pelagia" para que não houvesse sobreposição, mas sim para se
complementarem e termos mais sítios visitados”, afirma o investigador.
Okeanos team is already on board the dutch ship Pelagia for another scientific mission to the Deep Sea, with the main objective of making an integrated assessment of the distribution of vulnerable marine ecosystems along the Mid-Atlantic Ridge in the Azores region 🤩 https://t.co/MToJG0j0pW
— Okeanos - UAc (@OkeanosUac) July 29, 2022
Também com a embarcação “Arquipelago”, equipada com um sistema de câmaras
desenvolvido pelo Instituto de Investigação em Ciências do Mar – Okeanos,
estão a ser realizadas expedições, em menores profundidades, para criar “uma
ideia do que existe no mar profundo dos Açores e da distribuição das
diferentes espécies” pela região.
“Acabámos por dividir o trabalho em visitarmos sítios e profundidades
diferentes”, explica Telmo Morato, acrescentando que este mapeamento do
oceano profundo e da biodiversidade irá também contribuir para aumentar a
rede de área marinha protegida nos Açores. A iniciativa é do Governo
regional e as informações estão a ser transferidas para o Executivo “quase
em tempo real para informar a decisão de que áreas se devem escolher estas
decisão”.
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