quinta-feira, 23 de maio de 2019

Santa Clara. No princípio era o leão...


Hoje, o Santa Clara tem uma palavra a dizer sobre o título. Em maio de 1935, esteve pela primeira vez em Lisboa. Trazia um leão nas camisolas.

Na lista infinita dos homens que ficam registados nas páginas da História, cada um escreve os nomes que entende. Na lista daqueles que ficaram para sempre na vida do Clube Desportivo Santa Clara, fundado em Ponta Delgada no ano de 1937, escolhi estes: Andrade; Serrão e José Faria; António Raposo, Duarte e Vítor Raposo; Manuel Faria, João Pedro, Mariano Joaquim; José Saldanha e José Ferreira. Onze nomes: uma equipa de futebol.

No dia 22 de maio de 1935, tornava-se a primeira equipa do arquipélago dos Açores a visitar Lisboa e a defrontar o Benfica, nas Amoreiras. Tomara aos encarnados que as coisas fossem hoje tão fáceis como o foram há 84 anos. A vitória por 11-2, com 4-1 ao intervalo, não deixava dúvidas sobre a diferença de qualidade entre as equipas. Na crónica publicada no jornal Os_Sports, podia ler-se: «Os visitantes formam um grupo fraco que joga um futebol muito primitivo. Encaixaram a bagatela de onze ‘goals’ no encontro com o Benfica, podendo sofrer derrota ainda mais ampla se, na primeira parte, os avançados benfiquistas tivessem ajeitado o pé. Os ilhéus têm apenas a seu favor a boa aparência atlética; propriamente, como jogadores de futebol, estão ainda no ABC».

Ainda assim houve destaque para o guarda-redes Andrade, que andou num atafona dentro e fora da baliza, e para o defesa Serrão.

Fernando Cardoso (2), Vítor Silva (3), Luís Xavier (4), António Gonçalves e Domingos Lopes marcaram os golos dos lisboetas. João Pedro marcou os dois dos micaelenses, sendo o primeiro de penálti. Como era diferente o futebol em Portugal...




Mudar de vida...

Curiosamente, a viagem do Santa Clara ao continente e o jogo frente ao Benfica mexeu profundamente com a existência do clube.

Nascido de um movimento desportivo, popular e espontâneo, que teve o seu apogeu nos anos de 1919 e 1920, os Campeonatos de Santa Clara, que reunia equipas formadas pelos empregados de fábricas dessa zona operária de Ponta Delgada, repartiu inicialmente o protagonismo com o Santa Clara Football-Club e com o Sport Clube Santa Clara.

Nos primórdios da fundação, equipava à riscas vermelhas e brancas, horizontais e exibia no peito um leão impante no topo do mundo. O lema era «Mens Sana in Corpore Sano». Era e ainda é, já agora. O ano de 1935 traria uma nova vida. à qual não foi alheia a grande popularidade que o Benfica gozava na ilha de São Miguel.

A despeito da robusta derrota, os dirigentes açorianos tentaram uma ativa aproximação aos benfiquistas. Nesse mesmo ano, a burocracia avançou com uma rapidez muito pouco própria nestas matérias burocráticas. O Clube Desportivo Santa Clara requisitou passar a ser filial do Benfica e obteve a autorização para ser considerado como a 5.ª Delegação do Sport Lisboa e Benfica. Como tal, eram-lhe exigidas determinadas obrigações e elas não passavam, certamente, por ter um leão no emblema. Por isso, os açorianos adotaram uma cópia do emblema do Benfica com minúsculas diferenças que quase não se topam à primeira vista de olhos: em vez da águia, um açor; em vez de «E Pluribus Unum», «Mens Sana in Corpore Sano». No dia 1 de Novembro de 1937, face ao Clube União Desportivo, estrearam as camisolas vermelhas e os calções brancos do clube-sede.

É preciso dizer-se que a ligação entre o_Santa Clara e o Benfica nunca foi muito forte e que se diluiu naturalmente com o tempo ao ponto de ser, hoje, inexistente. O marketing desenvolveu novas imagens e apagou as antigas. Hoje, na Luz, será como se o leão tivesse de novo regressado ao peito dos açorianos...

Fonte: Sol.sapo.pt

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