sábado, 30 de dezembro de 2017

Açores vão ter o selo de destino sustentável



Arquipélago será o primeiro do mundo certificado pelo Conselho Global de Turismo Sustentável em 2019

Os Açores formalizaram este mês a candidatura à certificação de destino de turismo sustentável, sendo o primeiro arquipélago do mundo a perfilar-se para ter este selo do Conselho Global de Turismo Sustentável — na designação original, Global Sustainable Tourism Council (GSTC), organismo que integra várias entidades das Nações Unidas. Esta certificação deverá ser obtida em 2019, tendo os Açores de cumprir até lá as metas dos mais de 40 critérios estabelecidos pelo GSTC, e que serão alvo de avaliação periódica.

“Nesta ambição de ser o destino mais sustentável do mundo, que os Açores sejam o nosso emblema e a peça-chave do tipo de turismo que Portugal quer ter, com impacto positivo em todo o território”, enfatizou Ana Mendes Godinho, secretária de Estado do Turismo, na conferência “Açores no Rumo do Turismo Sustentável” que decorreu no início de dezembro em Lagoa, na ilha de São Miguel.

POPULAÇÃO SATISFEITA COM O TURISMO É O CRITÉRIO-CHAVE
São ainda poucos os destinos certificados em turismo sustentável, e os Açores também irão aqui fazer história e constituir um caso de estudo. Os próprios critérios do GSTC são recentes e resultam da nova reflexão que está a haver a nível internacional face ao rápido crescimento do turismo em todas as regiões do mundo, os seus impactos positivos e negativos, e o rumo que se quer seguir no futuro.

“É mais fácil certificar um alojamento isolado do que um destino inteiro e num sector tão complexo como o turismo”, reconheceu Luigi Cabrini, presidente do Conselho Global de Turismo Sustentável, na conferência que decorreu nos Açores. “Há definitivamente um progresso do turismo no crescimento económico a nível mundial, no entanto não podemos dizer hoje que vai tudo bem.” Alertando para o reverso do crescimento e os riscos de “perda de identidade” com a pressão turística sobre o ambiente natural e o património, levando à constatação que “isto não é mais a região original”, Cabrini lembrou que “turismo e cultura podem ser os melhores amigos ou os piores inimigos, dependendo se isto é bem gerido ou mal gerido, e neste último caso o destino perder o valor e até o interesse dos turistas em o visitar”.

“E pior: as comunidades podem desenvolver uma atitude negativa em relação aos turistas que não as respeitam, o que já foi demonstrado em casos recentes em Amesterdão ou Barcelona”, sublinhou o presidente do GSTC.
Os critérios que os Açores têm de cumprir para obter o selo de turismo sustentável em 2019 envolvem impactos económicos, no ambiente ou no património, mas o lugar de destaque é dado à população residente. “O grande foco tem de estar na comunidade local, esta deve ser parte ativa e um dos principais pilares nesta construção de turismo sustentável”, frisa Luigi Cabrini, advertindo que o objetivo “não é só construir um destino turístico, é certificar que tem a procura certa. É preciso mostrar números, mas é mais importante ver se a comunidade local efetivamente ganha com o turismo”.

O rumo a tomar, segundo os especialistas, obriga a refazer todos os conceitos de turismo, em que o foco deixa de ser o volume e passa a ser o valor. “Afinal, quem é o bom turista? Para uns, será aquele que vem de helicóptero, joga golfe e bebe vinhos franceses. Mas por exemplo os mochileiros vão às terras mais pequenas, passam mais tempo no destino e envolvem-se mais com as comunidades”, faz notar David Simmons, professor de Turismo na Nova Zelândia, considerada um exemplo em turismo sustentável. “Quando virem mochileiros, não digam que não é bom turismo, é apenas diferente.”

Segundo David Simmons, na análise custo/benefício do turismo deve-se medir ao detalhe os impactos em energia, água e outros recursos. “Um turista que gasta 12 vezes mais água que um local (se jogar golfe é 60 vezes mais), como pode ser sustentável?”, questionou.

Aqui, os Açores estão no bom caminho, garante Marta Guerreiro, secretária regional da Energia, Ambiente e Turismo. “O tipo de turista que nos visita traz cada vez mais valor à região, pode fazer surf, mergulho, observação de cetáceos e acabar o dia a tomar banho, tudo isto liga tão bem nos Açores”, nota Marta Guerreiro. “Temos consciência que a sorte e o crescimento que temos tido se deve a todo este legado natural e patrimonial, que temos a grande responsabilidade de preservar”, salienta. “Temos uma certeza: não somos, nem queremos ser, um destino de turismo de massas.”

AMERICANOS A CHEGAR
Os Açores são um caso de crescimento rápido no turismo, e o salto ocorreu desde há dois anos, com a abertura dos voos de baixo custo. É a região onde o turismo mais está a crescer em Portugal, este ano com um aumento de dormidas de 16,3% nos primeiros dez meses, e que em 2016 foi de 21,1%. Um sinal de crescimento para 2018 vem dos cinco voos semanais de Nova Iorque a Ponta Delgada que a companhia americana Delta Airlines vai começar a operar a 25 de maio.

“O mercado americano está a chegar, e já tem tido resultados extraordinários nos Açores. Os bons destinos têm facilidade em captar os turistas e as rotas aéreas”, enfatiza Marta Guerreiro, prevendo continuação do crescimento turístico em 2018. “É a tendência, não há razão nenhuma para que não aconteça, não podemos é estar todos os anos com crescimentos tão acentuados.”

Já se notam nos Açores sinais de massificação com o rápido crescimento do turismo? “Não, estamos é a antecipar caminhos, a aprender com regiões que sofreram esses booms no turismo e com um plano B para manter intacta a imagem de sustentabilidade que toda a gente tem dos Açores, e que as faz vir cá”, considera Cristina Ávila, delegada do Turismo dos Açores em Lisboa, defendendo que a certificação turística que se prepara para o conjunto das ilhas “deve ser alargada a outros sectores, como também a agricultura, tem de haver esta transversalidade para o destino ser sustentável na sua plenitude, é um trabalho muito importante a fazer”.

A secretária de Estado do Turismo enaltece o facto de os Açores estarem na linha da frente desta certificação mundial, e “pela primeira vez com metas e indicadores precisos, em particular para medir a satisfação das populações locais, é muito importante saber se o turismo é ou não bem aceite pelos residentes”. Segundo Ana Mendes Godinho, “estamos a antecipar discussões de sobrecarga, e temos de ser inteligentes no rumo que traçamos e a gerir a procura que queremos ter”.

in expresso.sapo.pt

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