Tiago Miranda
Centro internacional de investigação para o clima, energia, espaço e oceanos vai nascer nos Açores em 2017
A criação de uma base espacial no Aeroporto Internacional das Lajes, na ilha Terceira, onde possam ser feitos lançamentos low cost de foguetões com microsatélites e grandes constelações de satélites, está a ser estudada pelo Ministério da Ciência, governo regional dos Açores, NASA, agência americana de meteorologia e oceanos (NOAA), Departamento de Energia dos EUA, dez universidades portuguesas e americanas e várias empresas.
A base espacial é a principal componente do projeto de instalação de um grande centro de investigação internacional nos Açores, que começou a ser publicamente discutido a 10 de junho nas celebrações do Dia de Portugal em Nova Iorque, numa conferência que reuniu responsáveis de todas estas instituições e empresas. E que vai continuar com novas conferências a 27 de junho na Universidade dos Açores, em Ponta Delgada, a 4 de julho em Lisboa, a 19 de setembro em Bruxelas e em novembro e dezembro em três universidades americanas que têm parcerias com Portugal: o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e as universidades do Texas em Austin e Carnegie Mellon.
O centro de investigação vai chamar-se AIR Center (Azores International Research Center) e o objetivo é desenvolvê-lo em infraestruturas já existentes no arquipélago dos Açores, como o aeroporto das Lajes, as instalações de medição da radiação atmosférica do Departamento de Energia do Governo dos EUA na ilha Graciosa ou o Departamento de Oceanografia e Pesca (DOP) da Universidade dos Açores na ilha do Faial. Note-se que os Açores acolhem também estações da Rede Atlântica de Estações Geodinâmicas Espaciais nas ilhas das Flores e de Santa Maria, a Estação de Rastreio de Satélites da Agência Espacial Europeia (ESA) e a Estação Sensor Galileu (o GPS europeu), igualmente em Santa Maria.
“A evolução da tecnologia tem sido muito rápida e permitiu democratizar o acesso ao espaço”, afirma ao Expresso o ministro da Ciência. Manuel Heitor (ver entrevista) recorda que “há cinco anos o lançamento de um satélite custava no mínimo quatro milhões de euros e hoje custa apenas 150 mil, enquanto os satélites mais pequenos pesavam 50kg e hoje pesam 1kg”. A tendência na indústria é colocar constelações de satélites no espaço, pelo que “ter uma base espacial no meio do Atlântico, numa localização muito favorável para esse tipo de lançamentos, é uma grande vantagem. E o aeroporto das Lajes tem todas as infraestruturas adequadas e espaço aéreo livre para acolher uma base de acesso low cost ao espaço”.
SETE PROJETOS EM DISCUSSÃO
Além da base espacial, que poderá ter o nome de Atlantic Spaceport, estão em discussão mais seis projetos. Um deles é o ASORES, Plano de Ação para a Sustentabilidade, Proteção Operacional e Resiliência da Terra e dos Sistemas Espaciais, promovido pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), NASA, ESA, Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) e consórcio empresarial C3P. O outro é a instalação em São Miguel do centro de dados da grande antena parabólica de 32 metros do futuro radiotelescópio SKA, que vai ser construída na ilha.
O SKA, um projeto global que envolve mais de 100 instituições de 21 países, incluindo Portugal, terá uma rede de centenas de milhares de antenas concentradas principalmente na África do Sul e na Austrália, e começará a funcionar em 2023.
Nesta área há ainda um terceiro projeto, a construção de um radar de rastreio e vigilância do lixo espacial. O boom dos satélites comerciais, governamentais e militares em todo o mundo fez crescer para um milhão o número de objetos em órbita à volta da Terra, fragmentos de satélites desativados e de foguetões. Estes objetos podem chocar com os satélites ativos, a Estação Espacial Internacional ou qualquer nave lançada da Terra. E se decaírem das suas órbitas atuais, muitos deles não se vão desintegrar totalmente ao atravessarem a atmosfera, devido à sua dimensão, podendo atingir qualquer zona habitada do planeta. Uma síntese da FCT sobre os sete projetos sublinha que “os Açores podem tirar partido do seu reduzido tráfego aéreo e localização geográfica única para acolherem um radar de rastreio e vigilância espacial e assegurar a cobertura permanente sobre o Atlântico”.
Mas não é só ao espaço que o futuro AIR Center se poderá dedicar. Um laboratório no Departamento de Oceanografia e Pesca da Universidade dos Açores na cidade da Horta, na ilha do Faial — o Lab-Horta@DOP & Cold Water Coral Lab —, com infraestruturas que permitam a recriação artificial das condições naturais do ambiente do mar profundo, irá abrir oportunidades de investigação nas fontes hidrotermais, ecossistemas, biologia marinha, geologia e oceanografia. Depois, o modelo de incubação de empresas da ESA que já existe em Portugal (incubadora em rede em Coimbra, Porto e Cascais) pode ser replicado nos Açores, atraindo capitais privados da UE e EUA. O documento da FCT propõe a instalação de um campus que acolha empresas inovadoras “de elevado risco e elevado retorno” (startup).
Fausto Brito e Abreu, secretário do Mar, Ciência e Tecnologia do governo regional dos Açores, admite ao Expresso que “a ligação do AIR Center com as negociações entre Portugal e os EUA sobre o futuro da Base das Lajes será óbvia quando se acordarem as compensações para os Açores, embora os processos sejam paralelos”. Nesta fase de discussão do projeto do centro de investigação internacional no arquipélago “estamos a tentar que todo o processo chegue a um nível de maturação tal, que se torne irreversível quando chegar a nova Administração americana saída das eleições presidenciais de novembro”.
in expresso.sapo.pt
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