Estou aqui nos Açores, mas não estou ali na América
Cinco portugueses no papel, cinco americanos no coração, cinco deportados. Não são repatriados, porque aqui não mora ninguém que sinta que a sua pátria é esta. Crime e castigo, América e Açores, “I’m here, but I’m not here”
É a coisa mais difícil da vida de Dinarte Branco, esta que sobe esta sexta-feira ao palco do Maria Matos.
Cinco portugueses no papel, cinco americanos no coração, cinco deportados. Não são repatriados, porque aqui não mora ninguém que sinta que a sua pátria é esta. Crime e castigo, América e Açores, “I’m here, but I’m not here”como diz Paulo Pacheco, dorido terceirense que queria continuar a morar no Canadá que foi seu durante 50 anos. I don’t belong here, ou de como cumprir penas nos países para onde se emigrou ainda criança pode acabar num escarro sobre a identidade de Zita, de Paulo, de António, de José, de Luís.
“São expulsos, são cuspidos dos EUA e do Canadá”, atira Nuno Costa Santos, co-autor com Dinarte Branco da peça que já teve ante-estreia e estreia em Montemor e que fica até dia 15 no Maria Matos, em Lisboa, para depois viajar pelo país (Torres Novas, Porto, Guimarães, Coimbra, Ovar, Viseu, Açores). I don’t belong here é um espectáculo engajado, é uma resposta a um desafio do Observatório dos Luso-Descendentes a Dinarte Branco. O actor encena dois actores profissionais e cinco deportados confessionais que contam as suas histórias - “Somos histórias que muitas vezes não se partilham, escondidas atrás de muros que criamos”, como descreve Nuno Costa Santos.
Estamos na América de camisola e boné dos New York Yankees, inglês nativo, desejo expresso de que um dia as suas cinzas vão “de volta para os States”. Zita chegou lá aos 6 anos e cumpriu outras tantas penas num total de dez anos de prisão. Em palco, troca com a actriz Cláudia Gaiolas. Zita recita o juramento de lealdade à bandeira dos EUA, Cláudia devolve-lhe a letra do hino português. “Confiei na América, confiei nos Açores e olha onde estou. Na lua. Vocês são doidos? Sou açoriana de sangue mas sou americana 100%.” José, aliás Joe, encena a decisão do tribunal de o deportar. Acaba a cena enrolado em película aderente.
O que Dinarte Branco quer é “que o público possa conhecer estas pessoas, expor o absurdo que é querer fazer deles 'portugueses' ao fim de 50 anos de vida no Canadá ou nos Estados, fazendo o foco no indivíduo e não através de um manifesto político”. Para ele, a teoria ficou para trás. “Uma coisa é acharmos que as pessoas depois de pagarem pelos seus crimes têm direito a uma segunda oportunidade, outra é praticarmos essa 'segunda oportunidade'”, explica. Por isso, o longo processo, o ganho de confiança, o largar e viver, “foi a coisa mais difícil que fiz até hoje”. “Acho que fizemos um teatro de compromisso, em que sabemos que podemos contar uns com os outros.”
Fonte: Publico
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