Em 2012, Ricardo Cabral passou três meses na Google. Pouco depois, a gigante tecnológica partiu à conquista do interior dos edifícios com um serviço que converte fotos em plantas.
Ricardo Cabral está ainda a viver os primeiros dias do resto da sua vida: «Defendi a tese de doutoramento há uma semana». O doutoramento já lá vai, e agora há uma proposta sobre a mesa: «A Google já me convidou para trabalhar lá. Ainda não respondi, é uma questão que está em stand-by», acrescenta o especialista em visão por computador, que repartiu o doutoramento entre o Instituto Superior Técnico e a Universidade de Carnegie Mellon, nos EUA.
Caso aceite o convite, não será a primeira vez que Ricardo Cabral, 28 anos, entra nos escritórios de Mountain View, que albergam a sede da gigante das tecnologias. No verão de 2012, o jovem de Ponta Delgada estreou-se na Google. Foi apenas um estágio curricular, mas deixou marcas para a posteridade. Juntamente com o orientador da tese de doutoramento, Ricardo Cabral desenvolveu o algoritmo necessário para transformar em plantas as fotos tiradas no interior de um edifício.
Passaram quase três anos, e a Google trouxe, de algum modo, o Indoor Maps para junto de um dos seus criadores. Hoje, nos corredores do Técnico já é possível recorrer ao Indoor Maps para saber onde fica a biblioteca, o refeitório ou um qualquer departamento de investigação. É apenas um dos 49 locais abrangidos aquando da chegada das plantas do Google a Portugal. Palácio de Queluz, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de Congressos do Estoril, Estádio do Dragão e várias estações de metro e comboios já foram abrangidas pelo Indoor Maps – mas por enquanto é ainda um serviço limitado. O utilizador não consegue obter a sua localização na plataforma da Google. Para essa funcionalidade se tornar possível, será necessário esperar pelos investimentos da Google em retransmissores bluetooth (beacons) que comunicam com os telemóveis dos utilizadores.
Ricardo Cabral acredita que a localização em tempo real dentro de edifícios vai abrir um novo filão de negócios e serviços. «Da mesma forma que hoje temos carros autónomos a percorrerem estradas, em breve, vamos ter robôs a andar dentro de casas e edifícios», explica o aluno de doutoramento do programa Carnegie Mellon Portugal .
O jovem açoriano mantém o foco na visão por computador. Hoje, ainda há um diferencial assinalável entre a forma como um humano vê e os mecanismos usados por um robô ou um computador para ver e interpretar o mundo. No Técnico, já há projetos de investigação que levaram ao desenvolvimento de sistemas que identificam objetos pela configuração. «Hoje há um ping pong entre a visão humana e a visão por computador, com o objetivo de replicar ou mesmo superar a visão humana através dos computadores. Em alguns casos a visão humana já foi superada pela dos computadores. Se comparar a Torre Eiffel de Las Vegas e a Torre Eiffel de Paris, se calhar, não consegue distingui-las, mas um computador consegue. É importante perceber como é que podemos ensinar os computadores a ver as coisas que os rodeiam… mas acontece que ainda não se percebe bem como é que os humanos veem e percebem as coisas que estão à sua volta», explica Ricardo Cabral.
Robôs que fazem diagnósticos médicos, efeitos espaciais mais realistas que a realidade, novas arquiteturas para a construção civil – são várias as áreas que acabarão por evoluir, caso o trabalho de Ricardo Cabral e outros investigadores comece a produzir efeito.
Os três meses passados na Google ainda permanecem frescos na memória. O acordo de confidencialidade assinado com a gigante da Califórnia não impede o jovem de fazer uma descrição em traços genéricos: «É muito agradável trabalhar lá. Há recursos e as pessoas gerem o seu tempo; os investigadores e engenheiros são muito valorizados e a empresa dá-lhes condições».
Se é assim tão bom, por que é que Ricardo Cabral não deu uma resposta de imediato e recomeçou a vida em Mountain View? O jovem investigador sorri: «Quem sabe se não aparece outra proposta melhor entretanto?».
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